Dia da Família
Agosto está no fim e achei importante escrever a respeito de uma data de grande importância: o dia dos pais, comemorado no segundo domingo desse mês.
Em um vídeo recente comentei sobre o fato de que algumas escolas optam por nomear o dia dos pais como o dia da Família. A meu ver, não desmerece de forma alguma os pais presentes e verdadeiramente participativos na vida dos filhos, por outro lado, ameniza a dor de uma maioria esmagadora de crianças e adolescentes que não têm a presença dessa figura importante em seu lar ou mesmo em suas vidas.
Que fique claro que o fato de um pai não morar na mesma casa que o seu filho não o torna menos pai! O que o torna apenas genitor é o não registro espontâneo mesmo sabendo que o filho é seu. O que o torna menos pai é não participar da rotina do filho, não ouvi-lo, não apoiá-lo, não levá-lo à escola ou não acompanhar o seu rendimento. O que o torna menos pai é a mãe não poder contar com sua presença durante uma febre de madrugada ou em qualquer questão relacionada a saúde do filho, mesmo que seja uma simples consulta de rotina. O que o torna menos pai é quando encontra desculpas para não ir buscá-lo ou mesmo morando dentro de casa seja sempre uma figura ausente. É apenas genitor aquele que acha que o filho precisa estar sempre a sua disposição, limpo, bem vestido, bem alimentado, mas não se preocupa em desempenhar um papel real na construção desse indivíduo. Um homem que está disponível para passar a noite acordado com os amigos, mas não pode retirar o carro às três da manhã para ir até a casa da ex-mulher e com ela levar o filho passando mal ao médico não é pai. É apenas o genitor, quando não honra e nem entende o título de homem, porque um homem de verdade não precisa que um juiz lhe diga que é obrigado a ajudar no sustento e cuidado dos filhos.
Se formos falar em números, de janeiro a agosto deste ano foram cerca de 110 mil crianças nascidas registradas sem o nome do pai no Brasil. Cerca de 500 crianças por dia! Friso que esse número é apenas deste ano, e que o abandono paterno aumenta exponencialmente à medida que a criança cresce. Como sabemos, não é de hoje que uma parcela significativa das famílias brasileiras é chefiada apenas por mulheres, uma triste realidade para um número cada vez maior de crianças e adolescentes.
Ao ver o meu feed no instagram me deparei com pessoas reclamando sobre a iniciativa de algumas escolas ao adotarem o dia da Família, ação criada justamente para diminuir um pouco a dor dessas crianças e fazer com que a data possa ser comemorada por todos, já que deveríamos viver em uma sociedade que busca evoluir e melhorar. Ao ver a quantidade de pessoas que comentam coisas como “eu também não tive pai e não morri”, ou “uma dose de realidade para essa geração mimizenta não faz mal”, me faz questionar o quanto as pessoas precisam de terapia, o quanto querem que o outro sofra tanto ou mais o que sofreram. Quando vejo essas pessoas tomando como embasamento apenas a sua realidade, apenas a sua situação, pregando pelo contínuo sofrimento do outro, apenas porque ela também passou por isso e sobreviveu, me questiono o quanto realmente evoluídos somos!
Ainda na minha rede social, vi várias criticas a um homem trans que é pai. De acordo com muitos, por não ter fornecido o esperma não poderia se dizer pai, mesmo sendo extremamente presente na rotina do filho desde a sua gestação. Este me parece ser muito mais merecedor do título de pai do que muitos outros que se apropriam dele sem jamais ter desempenhado suas obrigações e sem jamais entender ou se importar da sua importância. E sim, ser pai é um título com um peso gigantesco na história de todos nós!
Conversando com uma amiga após o dia dos pais, mãe de gêmeos e separada (é sempre uma amiga que te dá uma dose de realidade e uma sacudida), pude perceber mais ainda o quanto pode ser difícil essa data para algumas famílias: O genitor, apesar de ter combinado de ir buscar os filhos mesmo que fosse por algumas horas no domingo, não apareceu e nem se deu o trabalho de dar satisfação! Os presentinhos feitos pelos meninos foram guardados! A animação dos filhos no final da tarde para ela era de partir o coração, pois sabia que tudo iria se transformar em decepção, tristeza e dor. Não havia nada que ela pudesse fazer para mudar aquela realidade além de pegar os filhos, arrumá-los e levá-los para sair… mas nem mesmo o passeio evitou a pergunta triste de um dos meninos: “Cadê o papai?”. A resposta foi simples mas cheia de um peso que de acordo com ela, para eles é ainda muito cedo e muito difícil de perceber: “Não pôde vir”. A decepção evidente estava ali, nem o cinema, nem o melhor brinquedo que ela pudesse pagar amenizou a dor deles. Grande parte das mães que passam por isso se sentem um pouco culpadas por um erro que não é delas. Não têm como escolher um pai melhor para os filhos, porque só conhecemos as pessoas de verdade quando elas decidem se mostrar, e aí, já é tarde demais! Mas mesmo assim, como ela mesma disse, os pais nunca são culpados, ninguém puxa a orelha desse genitor ausente. Para ele sempre existe uma desculpa, algo mais importante. Para ele está tudo bem, mas e para os filhos? E para a mãe?
Vi ali a necessidade de escrever esse texto e dizer que se você é um pai presente, parabéns! Se você teve um pai presente, teve muita sorte, porque que nem todos os genitores são assim! Meio a tanta dor, tanto sofrimento, porque se incomoda quando algumas famílias com uma realidade diferente da sua comemorem o dia da Família? Porque em meio a tanto abandono um homem trans ser chamado de pai te incomoda tanto?
A vida não está mais fácil para essa geração. Queria que estivesse! Queria que, como sociedade, estivéssemos muito mais preocupados com o próximo. Queria que os genitores fossem mais conscientes e que sua ausência não custasse tanto a tantas crianças, mas infelizmente não é assim. Enquanto a sociedade não chamar a atenção dos pais o tanto que chama a das mães, não poderei desejar nada diferente do que um feliz dia da Família!